O linfoma e as próteses de mama

  • Artigo publicado em: 17 janeiro, 2018
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Por Joel Jacobovicz

De tempos em tempos a ciência médica aplicada é submetida a novas informações vindas dos laboratórios e das pesquisas básicas. Estas aprofundam conhecimentos muito estabelecidos. Desta forma, a medicina avança e permite que mais pessoas sejam tratadas melhor. Na cirurgia plástica isto não é diferente.

A partir de 2016, a Organização Mundial de Saúde reconheceu o linfoma de células anaplásicas associado a implantes de silicone (BIA-ALCL) como um novo tipo de entidade clínica independente dos outros linfomas. Embora não esteja comprovado que implantes mamários sejam os agentes causadores deste tipo de linfoma, fortes evidências sugerem esta associação. Recentes estudos mostram que esta não é uma doença da mama, mas, sim, que se desenvolve na face interna da cápsula fibrosa adjacente ao implante e que naturalmente pode infiltrá-la e aos tecidos ao redor da cápsula.

Na última atualização dos órgãos competentes dos EUA (FDA) e da Sociedade Americana de Cirurgia Plástica, foram relatados até o momento pouco menos de 400 casos nos EUA e predominantemente em mulheres submetidas a mamoplastias com próteses de silicone texturizada. Infelizmente, a dificuldade prática inicial em verificar os casos com precisão, dificuldade diagnóstica e desconhecimento da doença fazem com que os dados e as estatísticas estejam imprecisas no mundo todo. Neste ponto, a Sociedade Brasileira de Cirurgia Plástica, associada às outras sociedades de especialidade de outros países, trabalham no sentido de normatizar critérios e exames para identificação precoce de possíveis pacientes com a doença. Considera-se nos EUA o risco aproximado de desenvolvimento de BIA-ALCL de 1:30.000 mulheres com implantes texturizados. Na Austrália, segundo os órgãos de saúde daquele país, falam em um risco de 1:10.000 mulheres. Até o momento deste texto, nenhuma paciente de origem asiática foi identificada como portadora do BIA-ALCL. Essa ampla variabilidade expõe extensa controvérsia a respeito desta doença, e teorias para sua origem estão sendo propostas. A teoria multifatorial (fatores genéticos, textura do implante e biomas bacterianos diversos) é a mais aceita.

O diagnóstico desta doença passa pelo exame físico da paciente na busca de nódulos linfáticos palpáveis ou linfonodomegalia regional. Seroma tardio (após um ano ou mais anos) é o achado mais frequente nesta doença (60 a 70% dos casos). Este seroma varia de volume de 50 a mais de 500 cc e pode ser mais espesso que o seroma habitual, pois carrega alto teor de proteínas e células. O espessamento da cápsula da prótese é frequente, mas não necessário.

Em pacientes com aparecimento de seromas tardios, este líquido deve ser aspirado e enviado para exames específicos (CD30, ALK, citologia e citometria) que, embora não sejam exatos e nem empregados de rotina, sua positividade associada a achados clínicos, radiográficos e ultrassonográficos evidenciam a doença e ajudam em um tratamento precoce e eficaz.

Embora os poucos casos relatados direcionem a doença para os implantes texturizados, não há evidências até o momento que sugiram a não utilização destes implantes, cujos índices de complicações pós-operatórias são menos frequentes que os implantes lisos. Não se sugere também a troca destes implantes em pacientes assintomáticos.

O centro de Câncer Americano (NCCN) define que a cirurgia de retirada total da cápsula e dos implantes é o melhor tratamento para a maioria dos pacientes com linfoma restrito a cápsula ou no líquido adjacente à cápsula (seroma). BIA-ALCL avançado, como qualquer linfoma avançado, pode necessitar de tratamento oncológico específico.

Com a colaboração dos pacientes em retornarem para realizar suas consultas de rotina tardia, realização da ultrassonografia anual (método de escolha para iniciar a investigação) e maior esclarecimento e entendimento da doença, um número significativo de mulheres podem ser tratadas precoce e adequadamente desta doença.